quinta-feira, maio 10, 2007

Cais de Estio

Quando te tocar,
serei o monstro manso
que te assola a noite e te assalta o dia.
Quando te olhar, serei luz pura a iluminar o sem-rumo do teu coração.
Quando te tiver, serei memória de uma leva interrompida.
Saber-te-ei de cor quando,
no fim,
souberes
a Verão,
a fruta madura,
e a mel interrompido.

quarta-feira, maio 09, 2007

As tuas mulheres más

Sonhar contigo:
Imaginar as tuas mulheres más a afastarem-me aflitivamente de ti.
Querer-te mais do que não te querer.
Entrar no jogo da proximidade relativa
e imaginar puxar-te para mim.
Ter-te cada vez mais perto
quando estás longe.
Entrar numa nova abordagem da pele.
Voltar a jogar o teu jogo, sem querer,
por crer na mente mais do que no desejo.
Por querer o desejo todo à flor da luz.
Por sentir incessante o som do teu murmúrio.
Por querer imaginar o brusco e inalienável suor
de toda a irrealidade.

domingo, abril 01, 2007

Parabéns

Se fizesses anos hoje
não te dava os parabéns.
Fi-lo demasiado contigo.
Não te parabeneio,
meu para-bem.
Cuspo no teu medo e nos teus olhos doces
e não me arrependo.
Quase te odeio, mas esmagar-te-ia com um trago dos meus braços.
Fizeste-me entrar numa ficção barata: A que quer B que quer C.
Tu, senhor, sempre limpo e sem remorso. Sem pejo em gritá-lo a sete folhas brancas que nunca se noivaram.
Eu não te esqueci e tu não te esqueceste do teu ego inchado e temente.
Eu, sofredora-tipo básico - do que se pode encontrar em qualquer livraria ou loja de pronto-a-vestir -continuo a ler as tuas sentenças e a lambê-las como quem olha
para um edifício brilhante de um génio da arquitectura.
Construiste, só para mim, um elo que mói mais do que se olhasse ininterruptamente
para o fundo dos teus olhos doces.É um presente lustroso com um laço cor-de-rosa cheio de emoções passadas a limpo. Limpo como tu. Sem culpa, nem secreções.

segunda-feira, janeiro 29, 2007

O coração das entrelinhas

Foi há já muitos dias que,
com o desvelo que os anjos não sonharam,
me entreabriste a boca
e a encheste de rosas.
As pétalas eram tão minhas
que pareciam linhas dos teus dedos que, sem querer,
me tocavam

Sílaba a sílaba,
levei todos os dias desta jornada
a descobrir as maravilhas

Sabia das maravilhas,
não dos segredos que contas
ao espelho
que dá contas e contos
à tua vida

Levei esta jornada a querer coroar das rosas
que me trouxeste: no teu cheiro agri-doce,
na voz lânguida que descia sobre o meu corpo,
nas tuas mãos macias

O tempo quis que sorvesse
o ar jovial,
do passado que não te deixou marcas no rosto,
mas no coração das entrelinhas

Corpos que, encaixados, traçavam linhas perfeitas, os nossos.
A minha perna que te cobria do mundo:
o teu cansaço que não me exasperou.

Levámos esta jornada
a querer dar mais e mais e mais.
Um para o outro acarretávamos, sem saber,
a água para matar as sedes

Levámos esta jornada,
para chegar à fonte e deixar a água suada sujar-se de mundo.
Eu fiquei a olhar-te, cheia de sede.
Tu deste de beber ao medo e ao espelho
Num despudor pela leva
e pelo coração que guardo, sempre jovem.

sexta-feira, dezembro 29, 2006

Sem título II

Quero palavras,
sentidos,
vento e horizontes,

Quero paisagens, sortidos, segredos atrás dos montes
Quero o teu colo, foragido,
Que de alento me atiça

Um empurrão
para a falésia onde se sentam
os sonhos e a transparência da luz

Quero o sol,
O branco e o azul
O mar
E tudo o que me ilumina
o medo

Quero o sorriso
De duas crianças que trazem um farol na mão

Depois…
Dar à terra aquilo
que merece
porque a bênção
de estar aqui
é maior do que a
mais bela praia do mundo –
lugar mais-que-perfeito,
para saber da beleza toda

sexta-feira, dezembro 15, 2006

Sem palavras

Um cigarro aceso e a luz dos teus olhos era fel;
uma doce miragem e o teu cheiro exitação.
A longura dos teus dedos estranho prazer roubado às noites.
Todas as palavras eram possíveis;
todos os sentidos viáveis,
Abertos, todos os segredos e todos os colos

Apagaste a luz e o sol queimou-me a vista.
Por que foi que denunciaste a minha doce
luxúria e rasgaste o encontro?
E as nossas palavras? E os teus lábios? E o nosso dever de as falar?

quarta-feira, novembro 29, 2006

Sem título I

O meu coração só vê sangue à volta
afoga-se na água dos seus sentidos,
bebe do colo que já não é seu.

Tenho uma dor que corta
as feridas,
me deixa sem punhos,
sem sul,
sem vento.

Já não respiro porque
a arma que usaste me feriu
o senso
E, sem sentido,
caminho
vazia
para uma frente
de batalha
em putrefacção

Lutei até ao fim e não sei o que fazer,
agora,
com tanta luta vazia
e a minha morte por enterrar

Devolve-me o sul,
o vento, o azul.
O sorriso, o arrebatamento,
as maravilhas.
Devolve-me a entrega,
a crença. Dei-tas seladas
porque
já delas não precisava para outrém.

Agora quero tudo.
Todos os mundos para
estampar no livro da minha história.
E selar a rigor
a batalha que foi minha;
e me faz doer os ossos,
as memórias
e o coração que, encaixotado,
bebe de um vinho
alheio - nectar escuro, triste e inverdadeiro.