terça-feira, outubro 31, 2006

Espelho

O sorriso é aberto
e os olhos cálidos como uma paisagem de Maio.
Podias ser o meu espelho
nas horas vagas,
essas onde espalhas a tua
sabedoria do Mundo
e a ofereces como
quem escreve
o nome dos outros em grãos de arroz.
É a semente do trigo que colhes
para além do Tejo,
onde os sentidos se veraneiam
na planície prolongada;
onde os peixes
visitam os teus olhos
e te dizem segredos
de outros Agostos.
O cheiro que me sacode
é o da tua mão aberta a roçar
lábios vazios.
E o azul está lá,
para embalar a luz
que te alimenta.
E o mar? O mar, o mar, o mar,
que te molha em ondas de espelho.
O mar que nos alumia o
caminho.

domingo, outubro 29, 2006

O coração de fora

Com o coração
de fora
ainda te peço - não vás.
Ainda que roas a impossibilidade como
uma corda já partida
Ainda que olhes para o horizonte sem a minha
sombra
Ainda que odeies
todas as manias-minhas;
que odeies as exitações de quem te aponta o dedo só porque não cabe na pele.
Fica. Recorta-me a tua vida em papel
novo e dá-ma.
Limpa, mais uma vez, a minha solidão.
Não deixes que azede a pele que me cai com os restos
do Verão;
não deixes que se
esfarele a luz em dias de lume a arder.

domingo, outubro 08, 2006

Contradança

O lume,
o pior que há em mim.
Afiam-se-me as mais grotescas arestas,
numa flecha animal de raiva.
Espio o bode cá de dentro -
a CULPA -
a culpa do chão tirar
o tapete debaixo dos pés
a quem vai na contradança.
Quero-te mas não consigo:
não consigo-não desisto; não consigo-não desisto.
Não julgues,
peço-te 'não julgues'.
Estende-me a mão com todo o ódio que reunires.
Eu, gritar-te-ei num grito escrito numa bandeja escrupulosamente areada.
Olho-te e fumas, apenas e sofregamente,
o último cigarro
Queres despachar isto:
já chega de quartos enevoados
e labirintos miseráveis -
são (re)voltas que nunca pertenceram
aos teus cálidos
e tranquilos prazeres na Viagem